Segundo a mitologia grego-romana, o Adamastor é um mítico gigante, um dos filhos de Gaia que se revoltaram contra o deus supremo Zeus e foram derrotados, tendo como castigo serem jogados para o fundo do mar. No livro “Os Lusíadas” de Luís Vaz de Camões, composto por dez cantos, Adamastor é o monstro que provocou a impetuosa tempestade que se manifestou contra a expedição de marinheiros comandada por Vasco da Gama aquando da sua tentativa, bem sucedida, de contornar o Cabo das Tormentas, representando um passo decisivo no trilho do caminho marítimo para a Índia ao penetrar nos domínios da figura monstruosa, ou seja, o oceano Índico. Devido ao glorioso acontecimento, o rei D. João II renomeou o cabo, localizado na atual África do Sul em plena confluência dos oceanos Atlântico e Índico, como “Cabo da Boa Esperança”. Na verdade, o Adamastor representava metaforicamente o medo em navegar em mares nunca antes navegados, superado graças à audácia e sentido de descoberta dos navegadores portugueses, desafiando as mais pessimistas probabilidades de fracasso.
Seis séculos depois, e apesar de restarem apenas memórias daquele que foi o Império Colonial Português, cujo vasto território é hoje partilhado por 55 países, entre os quais os nove países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), a herança que Portugal deixou no mundo é de um valor inquestionável, pois o nosso país teve um papel decisivo na transformação do mundo em que vivemos, para o bem e para o mal. A língua portuguesa é a sexta mais falada do mundo, com cerca 240 milhões de falantes espalhados pelo mundo. Atualmente Portugal pode orgulhar-se de deter um nível considerado alto nos campos cultural, desportivo e industrial, cuja qualidade dos seus produtos exportados para o exterior é sobejamente reconhecido pela generalidade dos países de todo o mundo. Mesmo no campo da indústria automóvel, há várias décadas que vão sendo fabricados modelos de várias marcas e componentes para automóveis. No entanto, já fazia falta um projeto verdadeiramente promissor que rompesse com todos os anteriores projetos descontinuados de marcas nacionais, ainda que as marcas UMM e Portaro tivessem resistido durante vários anos com modelos que ainda hoje circulam nas ruas. Inspirado pelo mítico episódio da dobragem do bendito Cabo da Boa Esperança, no ano de 2012 foi iniciado um ambicioso projeto de um automóvel com alto pedigree desportivo, 100% apto para correr em qualquer circuito e 100% homologado para circular em estrada. A autoria do projeto é de dois empreendedores portugueses da empresa CircleRoad, Ricardo Quintas e Nuno Faria. Nasce assim a marca Adamastor. O nome do código: P003RL.
Este novo capítulo promete ser um novo Canto de “Os Lusíadas”, a afirmação da essência portuguesa no seio da indústria automóvel mundial, algo semelhante ao que se passa na Koenigsegg para a Suécia, na Alpine para a França, na Pagani Automobili para a Itália ou ainda na TVR para o Reino Unido.


O modelo, cujo nome de código é P003RL, é um roadster de dois lugares com 80% de materiais portugueses incorporados e encontra-se já no terceiro estágio de evolução como protótipo (daí a menção “P003”) e, embora tenha genes de competição automóvel e esteja exclusivamente vocacionado para condução desportiva, está apto e homologado para circular em estrada (daí a menção “RL”, iniciais de road legal). As suas formas esbeltas são fortemente inspiradas nas naus da armada de Vasco da Gama, o que lhe confere desde a sua conceção um estatuto de “puro sangue lusitano”, tal como o cavalo lusitano, a filigrana portuguesa, a guitarra portuguesa, entre outros ícones genuinamente portugueses. A sua cor azul não foi escolhida ao acaso, pois representa a cor dos oceanos. O seu design simples é ao mesmo tempo funcional, pois promove um comportamento aerodinâmico tremendamente eficaz que dispensa qualquer tipo de asa e spoiler, embora haja essa possibilidade de uso, demonstrada pelo desenho técnico. Estruturalmente, o carro possui uma carroçaria em material compósito, assente num chassis tubular lightweight, de elevada rigidez torcional, composto por aço de alta resistência, roll bar sem costura laminado a frio segundo as normas da FIA, estruturas de absorção de impacto e células de segurança, o que potencia as suas prestações em pista que manifestam a sua agilidade. Para desenhar a carroçaria, os engenheiros recorreram a software de topo para as funções de simulação de elementos finitos e de otimização na área de simulação estrutural e de dinâmica de fluídos.


Dinamicamente, o P003RL comporta-se como um autêntico carro de corridas à moda antiga, pois não possui qualquer tipo de ajudas à condução (ou melhor, pilotagem). Certamente assemelha-se a um Lotus Elise, a um Porsche 718 Cayman ou a um Alfa Romeo 4C, contudo existe algo mais do que isso. Nele existe a arte de navegar contra as tempestades do alto mar que naus portuguesas proporcionavam aos marinheiros na época dos Descobrimentos, transposta para o contexto de pilotagem em pista daquele que se pode chamar de “nau das pistas”. Para o seu genuíno comportamento, contribui também o sistema de suspensão de triângulos sobrepostos que é otimizado para a pista, com a grande vantagem de permitir o ajustamento de parâmetros tais como a altura do carro, o camber, o caster, o toe, a rigidez, o amortecimento, etc. Os travões não podiam escapar à filosofia de pilotagem agressiva, sendo compostos por discos flutuantes de 295 mm e 380 mm mordidos por pinças de alumínio de 4 a 6 pistões.

Pode-se afirmar que o carro é um ser com dupla personalidade. De frente, é todo sorridente e aparentemente bem disposto, convidando o condutor a embarcar na aventura. Mas, assim que o condutor entra no carro, por trás mostra um lado completamente oposto, que revela a personalidade dominante, que é tempestuosa e que não dá tréguas facilmente. E atenção que, tal como acontece em altos mares, a intensidade da tempestade pode variar.
Passando da metáfora à realidade… O carro tem uma grelha frontal que se estende por toda a zona frontal, dividida por três entradas de ar, e apresenta dois faróis moldados na zona inferior pela grelha frontal e na zona superior pela curva do capô frontal, capô este que é delgado nas zonas laterais e volumoso na zona central. Nas laterais tem duas proeminentes entradas de ar que canalizam para a zona do motor. A zona traseira, mais larga do que a zona dianteira, possui dois farolins redondos de dimensões relativamente pequenas (solução talvez inspirada no atual Mazda MX-5) e a terceira luzinha do travão, em linha reta e de pequenas dimensões. Na zona do “trapézio”, nas laterais da matrícula existem duas pequenas grelhas de libertação do calor do motor, e na zona inferior está colocado um difusor traseiro onde se encontra a ponteira de escape e, ao lado deste, uma luzinha redonda vermelha de nevoeiro (lado esquerdo) e uma luzinha redonda branca de marcha atrás (lado direito). Todas as entradas e saídas de ar estão cobertas de “ninhos de abelha”.

E por falar em motor, de realçar que existem variadas possibilidades disponíveis consoante o gosto do cliente, contando sempre com arquitetura entre 4 a 6 cilindros (em linha ou em V), com turbo ou aspirado, cilindrada entre 2,3 e 3,5 litros e acoplamento a uma caixa manual, semi-automática ou sequencial. Neste campo, e conforme já confirmado pela empresa nas redes sociais, a motorização base é, por si só, mais do que suficiente para libertar bastante adrenalina e causar o efeito “pele de galinha”, em conjunto com o peso-pluma estimado em 850 kg; neste caso, o papel cabe ao motor Ford Ecoboost 2.3 turbo de injeção direta com 4 cilindros, potência de 310 cv e binário de 434 Nm (motor que equipa uma das versões do atual Ford Mustang). Em todo o caso, o motor é sempre de combustão interna, montado transversalmente na zona imediatamente atrás do cockpit e, dependendo da configuração e respetiva potência, a relação Potência/Peso cifrar-se-á entre 264 e 529 cv/ton. Ou seja, o Adamastor admitirá (oficialmente) motores com potência entre 224 e 450 cv, o que representa um leque alargado de opções para potenciais clientes “pilotos”, sem contar com a possibilidade de receber motores com outras configurações e com potências fora do intervalo convencional, e mesmo sem ser 100% de combustão interna (pode ser híbrido ou mesmo elétrico). Pode ser um motor Ford, Porsche, Nissan, Chevrolet, Mercedes, whatever…

Em suma, o cliente pode escolher a motorização que mais se adapte aos seus desejos, desde que não comprometa a função estritamente desportiva do veículo e que respeite a filosofia de base definida pelos técnicos da marca, num processo que o construtor resolveu chamar de “cocriação”, pelo qual cliente e marca trabalham em conjunto para desenvolver um produto e chegar a um compromisso que satisfaça ambas as partes. Tal processo – que começa desde o draft e termina na construção do exemplar final e tem a finalidade de tornar o veículo um símbolo da personalidade do cliente – não se resume ao motor, mas também engloba os materiais, as cores, os acabamentos de interiores, o formato e o tamanho dos bancos, o tipo de suspensão e mesmo a estrutura em si do veículo, entre outros aspetos.

É a chamada “Alfaiataria Automóvel” que, neste caso específico, debruça-se no detalhe e esmera-se na escolha dos materiais mais nobres, que confiram um elevado nível de resistência e de fiabilidade. Tudo isto ao nível dos melhores construtores de automóveis desportivos do mundo, e com a particularidade de todos os momentos-chave da conceção e construção do veículo poderem ser captados em vídeo ou fotografia para mais tarde serem partilhados com familiares e amigos, e de ainda caber a assinatura de todos os responsáveis pelo design, engenharia, produção e montagem.
Antes de ter a hipótese de adquirir um exemplar do Adamastor P003RL, qualquer potencial cliente tem de passar pelo processo chamado “Adamastor Experience”, que decorre no circuito Vasco Sameiro, em Braga. Primeiro, porque o veículo não contém qualquer tipo de ajudas à condução. Segundo, porque existe a necessidade de aprender a domar “o animal” em condições reais, ou seja, na “arena” que é a pista, pelo que o potencial cliente ganhará, com aproveitamento positivo, as habilidades necessárias de pilotar o carro de corrida em segurança e terá plena noção de todas as suas potencialidades: as humanas e as do carro. Este programa é multifacetado, passando por aulas teóricas e práticas acompanhadas por coaching, e só uma performance positiva permite ao potencial cliente a aquisição do veículo, recebendo o Certificado Adamastor Driving Experience. É, de facto, um programa muito completo, comandado por pessoas credenciadas e que conhecem a fundo a filosofia da marca e do modelo em si, e que têm sobeja experiência em competição automóvel.
O modelo P003RL foi uma das grandes estrelas no Penafiel Racing Fest 2018 que decorreu a 15, 16 e 17 de junho de 2018, cumprindo com distinção o papel de carro “000” num evento de “rally sprint” perante de milhares de espetadores que ficaram eufóricos com a passagem do bólide. Ficou demonstrado que o desenvolvimento do veículo está num estado muito avançado e que está tudo praticamente a postos para que, finalmente e já neste ano de 2019, a versão final seja revelada e as primeiras unidades circulem nas ruas portuguesas (e não só). Ainda em 2018, o P003RL (que poderá adotar outro nome), recebeu muitas críticas positivas de uma revista sueca de automóveis, a Teknikens Varld, recebendo ainda grande destaque na edição #13 da revista portuguesa de automóveis autoDRIVE que guardo religiosamente. Também em vários sítios de internet portugueses, o modelo foi bastante referenciado.
O projeto Adamastor já tem provas dadas de que será um sólido construtor de automóveis desportivos, com reais possibilidades de chegar mais além. Graças a dois visionários portugueses, estudando a história da indústria automóvel em Portugal, que têm dado os passos certos rumo à edificação de um novo projeto de interesse nacional, procurando acima de tudo evitar cometer os erros cometidos pelos anteriores construtores. Inclusive, pode servir de base a um verdadeiro projeto 100% português para o desporto automóvel internacional que passe por correr em Le Mans, com pilotos portugueses. Como disse Fernando Pessoa, “Deus quer, o Homem sonha, a Obra nasce”. E isso tem acontecido com as mais variadas produções nacionais de grande valor, sinal de que o que é nacional e bom deve ser sempre valorizado, haja o devido reconhecimento.
A Adamastor não é apenas mais um construtor português, mas sim o construtor de automóveis desportivos português por excelência, que merece todo o apoio dos entusiastas de automóveis e diversas entidades. Prova da sua credibilidade são as parcerias tecnológicas com a Dragon Equation, a Crazy Kangoroo e a Altair, os patrocínios da Galp Energia (tecnologia Evologic) e da Caravela, e ainda o apoio institucional do ISAG.
Toda a informação sobre o projeto encontra-se no sítio de internet oficial da Adamastor, que vos aconselho vivamente a visitar.
Espero um dia poder fazer um teste dinâmico ao P003RL, e acho mesmo que me posso tornar num potencial comprador, pois acredito ter a essência de “piloto de automóveis”. E, acreditem pelas seguintes imagens do canal de YouTube da marca, vale mesmo a pena! Porque, se como protótipo de desenvolvimento é impressionante, então imaginem o modelo na sua versão final…