Os samurais eram soldados da aristocracia do Japão durante o período entre 930 e 1877, que seguiam um código de honra chamado Bushido. Os samurais tornaram-se na classe dominante do Japão em 1185, com a fundação do primeiro xogunato por Minamoto no Yoritomo. Com a restauração Meiji, em 1868, os samurais perderam o poder para o imperador e declinaram rapidamente, sendo perseguidos até ao extermínio, que ocorreu após o fim da Rebelião Satsuma, nove anos depois. Suas principais características eram a grande disciplina, lealdade e sua grande habilidade com a katana.
Contudo, o espírito de samurai não morreu. A industrialização do Japão proliferou no século XX, ganhando maior pujança depois da Segunda Grande Guerra que devastou todo o Japão, no que foi apelidado de “o grande milagre japonês”, com a grande assistência dos EUA que, ironicamente, lançou as duas bombas atómicas sobre as cidades de Hiroxima e Nagasaki que dizimaram multidões. A Honda Motor Co., Ltd. (vulgo Honda) nasceu apenas três anos depois do fim daquela guerra devastadora, que fez toda uma nação derrotada arregaçar as mangas para um novo começo.
Um dos carros de maior sucesso da história comercial da Honda, o Civic, começou por ser um simples hatchback citadino, nascido em 1972, com dimensões semelhantes, por exemplo, às do primeiro Nissan Micra. Desde então, atravessou várias gerações até chegar à décima, estreada em 2017. A partir da quarta geração, transformou-se num carro de cariz mais familiar, através da adoção de uma variante sedan (quatro portas com mala) que acompanhou, desde aí, todas as variantes de hatchback. A nona geração do Civic conheceu mesmo uma versão carrinha, seguindo a moda corrente de várias marcas europeias. A presente décima geração é a que apresenta as maiores dimensões de sempre e, ao mesmo tempo, a mais refinada, potente e tecnológica de sempre, sendo a que apresenta um design o mais radical possível, como se de uma armadura de um samurai se tratasse. E ataca a estrada como tal! E se é assim num Honda Civic normal, então imaginem no melhor Civic Type R de sempre, a quinta geração da sua história.
A saga Type R, a linha das gritantes versões desportivas da Honda, começou em 1992 por pequenas modificações às normais versões de estrada – tais como a diminuição do peso e o aumento do desempenho através de mexidas cirúrgicas no motor e de suspensões mais rígidas – que conferiram aos primeiros modelos um caráter de puro carro de corrida. O primeiro Honda NSX foi o primeiro a ter uma versão mais radical com aquele carimbo. Contudo, e face ao potencial dos motores com injeção eletrónica variável de combustível VTEC, a linhagem estendeu-se no tempo e para um mercado mais amplo, o que fez com que outros modelos recebessem esta espécie de “benção dos deuses da velocidade”: o Integra, o Accord e o Civic. Para além do símbolo Type R, a carroçaria de cor branca e o símbolo Honda de fundo vermelho são um tributo à primeira vitória da marca fundada por Soichiro Honda na F1.
O Civic foi, de facto, o modelo que melhor soube interpretar o espírito de competição automóvel da Honda. A geração EK9 (1997-2000) foi a primeira a receber esta versão desta vitamina, sendo capaz de elevar a potência do motor atmosférico de quatro cilindros em linha VTEC 1.6L para 185 cv. O seu interior tinha autênticas bacquets de competição forradas a vermelho, encostos dos braços forrados a vermelho nas portas, tapetes vermelhos do estilo Type R, uma alavanca de 5 velocidades em titânio e um volante de couro da Momo. Seguiram-se as seguintes gerações: a EP3 (2001-2006), de motor atmosférico 2.0L com 200 cv; a FN2 (2006-2011), versão estritamente europeia, de motor atmosférico 2.0L com 201 cv; a FK2 (2015-2017), a primeira com a adição de um turbo no motor 2.0L que fez a potência aumentar consideravelmente para um patamar impensável de 310 cavalos; finalmente, a presente geração FK8, estreada em 2017, que manteve a mesma tecnologia de motor da geração anterior, mas agora com 320 cv. Muito provavelmente, será o último Civic Type R da história. Ou talvez não…
Mantendo o espírito basilar da primeira geração, o novo Civic Type R apresenta um design exterior altamente radical, motivado essencialmente pela necessidade de se tornar extremamente eficiente no campo aerodinâmico, garantindo uma estabilidade sem par, mesmo em curva. Neste campo, nenhuma outra marca com modelos deste sub-segmento o consegue bater, graças a pormenores aerodinâmicos que exploram ao máximo a veia desportiva. A asa traseira de grandes dimensões é tão eficaz que, mesmo com tanta força descendente gerada, não provoca nenhum arrasto adicional que poderia fazê-lo gastar mais borracha. Como se não bastasse, acima do vidro traseiro existe um gerador de vórtice, o qual contém pequenas barbatanas que criam um redemoinho que puxa o ar para longe da traseira do carro, reduzindo mesmo o arrasto. A capota do motor em alumínio é aerodinamicamente moldada para cortar o ar, com um canal de ventilação posicionado na zona mais elevada para que a quantidade de ar necessária entre no compartimento do motor para manter uma boa temperatura do motor. As entradas de ar e o parachoques dianteiro foram desenhados especificamente para criar uma zona de baixa pressão, começando logo aí a gerar a estabilidade máxima possível do carro a altas velocidade. Os próprios faróis com luzes em LED são autênticas esculturas em vidro que também contribuem para o desempenho aerodinâmico. A tripla ponteira de escape não é um mero adereço estilístico; contribui também para o aumento do desempenho do motor turbo de dois litros alimentado a gasolina (i.o. 98). Todo o design exterior condiz muito bem com as enormes jantes em liga leve de 20 polegadas, com a versão desportiva do símbolo Honda, que calçam pneus de tamanho 245/30 ZR20, indispensáveis no altíssimo grau de aderência ao piso. As quatro rodas vêm equipadas com travões de disco perfurados, cujas pinças Brembo são pintadas a vermelho.
O interior desta nova geração é a mais espaçosa de sempre e com o melhor nível de qualidade de sempre, com um aumento do espaço em altura e um centro de gravidade mais baixo, proporcionando ainda uma posição de condução mais baixa face ao modelo anterior. Embora contenha pormenores estilísticos muito modernos, ainda assim transporta duas essências que foram transmitidas desde a primeira geração: bancos de estilo “bacquet” forrados predominantemente a vermelho (se bem que num modo mais discreto de modo a conferir um conforto superior aos ocupantes da frente), e a alavanca das velocidades redonda com escrita em vermelho, neste caso revestida de alumínio. Nesta geração, a zona inferior do volante e o tablier estilisticamente exemplar, com revestimento parcial em carbono, contém traços a vermelho, realçando o ambiente “Type R”. Outro pormenor, particularmente delicioso: a placa com a inscrição do logótipo “Type R” e o número de fabrico da série. Esta geração melhora também em termos de visibilidade, já que adota uma linha de tablier mais baixa e pilares mais estreitos, não esquecendo as generosas dimensões dos espelhos retrovisores, cujo estilo aguçado permite ao condutor ver o mais perto possível do limite do ângulo morto. A complementar a desportividade do Type R, o visor integrado do painel de instrumentos possui uma função de iluminação específica do modo de condução que mostra níveis crescentes de intensidade à medida que se aproxima do modo mais desportivo “+ R”. O painel inclui um indicador de mudança de velocidade em LED, um medidor de pressão, um medidor de forças centrífugas e um medidor de tempos por volta. Nesta era de profunda conectividade ao infoentrenimento, o sistema Honda CONNECT contém uma aplicação chamada AHA, que permite ouvir estações de música, podcasts e serviços noticiosos através de internet, permitindo ainda o visionamento de filmes através da ligação HDMI. Claro está, é possível aceder a informações e ouvir música do smartphone através das ligações USB e Bluetooth. Tudo isto é visionado num ecrã tátil de 7 polegadas.
A dinâmica está num nível claramente acima da média. Para além dos 320 cv de potência máxima às 6500 rpm e dos 400 Nm de binário, que permitem ao samurai dos tempos modernos acelerar dos 0 aos 100 km/h em 5,8 s e atingir a bombástica velocidade máxima de 272 km/h (em condições favoráveis), o novo Type R possui três modos de condução, alternados por uma pequena alavanca localizada na base da maneta da caixa de seis velocidades. O modo básico é o “Comfort”, que permite um modo mais suave e uma maior economia nos consumos – ideal para ambientes citadinos. A seguir, o modo “Sport”, predefinido assim que o carro é ligado, permite um rácio equilibrado entre condução económica e o comportamento dinâmico – indicado para estradas abertas fora da cidade. Por fim, o modo “+R” é aquele em que o barulho do motor e das saídas de escape entram no nível mais estridente, refletindo-se numa direção mais precisa e pesada, numa resposta mais rápida às solicitações do acelerador, num maior endurecimento dos amortecedores – especial para track days. Neste estágio de performance é onde se nota mais a função de Rev Match, que simula a função de ponta-tacão nas reduções de marcha tal como nos carros de competição, permitindo que não haja brusquidão em situações extremas. A carroçaria de grande rigidez e o novo sistema de suspensões trabalham em conjunto de modo a otimizar a transferência de potência para o asfalto e facilitar a maneabilidade do veículo. Enquanto que a suspensão frontal é do tipo MacPherson de modo a reduzir o binário da direção e a melhorar a agilidade de condução, a suspensão traseira é do tipo multi-link, ajudando a melhorar a estabilidade em travagem. O sistema de suspensão é ainda auxiliado pelo Sistema de Suspensão Adaptável e pelo diferencial de deslizamento limitado que otimiza o controlo e a estabilidade para uma condução mais segura no limite e, na mesma medida, mais viciante.
Neste modelo de pleno caráter desportivo (sem deixar de ser estradista), não faltam os sistemas de segurança indispensáveis à segurança dos tripulantes, concentrados no Honda SENSING: o CMBS (Sistema de Travagem Atenuante de Colisões, o LKAS (Assistência de Manutenção na Faixa de Rodagem e Sistema de Reconhecimento de Sinalização de Trânsito). Não parecendo ser um sistema tão complexo como o de outras marcas, ainda assim chega para manter o Type R nos trilhos.
O novo Civic Type R está disponível em Portugal desde novembro de 2017 nas cores “Championship White”, “Crystal Black Pearl”, “Polish Metal Metallic”, “Sonic Grey Pearl”, “Rallye Red” e “Brilliant Sporty Blu Metallic”. É ainda possível colocar uns quantos adereços extras interessantes que realçam ainda mais o aspeto radical do Type R, incluídos nos packs exteriores e interiores em carbono, no Pack Ilumination Vermelho que acrescenta uma tonalidade de iluminação em tom de vermelho, entre outros. Existem dois níveis de equipamento: a versão Type R, com PVP a partir de 47.040 € e a versão Type R GT, 3000 € mais cara (esta tem apenas mais alguns extras face à primeira).
Para o mercado português estará disponível uma edição especial limitada a 18 unidades, chamada “Type R #18 Tiago Monteiro”, unicamente na cor “Championship White”, apadrinhada pelo antigo piloto português de F1 que atualmente representa a Honda no atual FIA WTCR, Tiago Monteiro. Esta versão está numerada de 1/18 a 18/18, contendo como elementos distintivos a inscrição do número 18 (número que sempre acompanhou o piloto em toda a sua carreira) e sua assinatura (tanto nas portas da frente como na zona traseira dos bancos dianteiros), aplicações de série em carbono e ainda as ponteiras de escape da Remus, responsáveis pelo acréscimo de 10 cv de potência máxima face à versão corrente.
Na minha opinião, o Honda Civic Type R (FK8) é o melhor hatchback desportivo do mundo fabricado em série e, talvez, o melhor de sempre de toda a indústria automóvel. Há dúvidas?